16.8.05

CONCHA VAZIA

"As praias com brumas são para sensibilidades mais requintadas. As outras, sem nebelinas, estão talhadas para pessoas mais simples."



"(...) Depois, destaque para três álbuns muito bonitos.
A Baía de São Martinho do Porto, coordenação de Maria Cândida Proença.

São Martinho do Porto é uma praia de que se gosta muito, mas eu nunca consegui gostar muito. Acho muito triste, muito triste, muito triste...

Acha?

Acho. Sempre que lá fui, chovia ou estava o céu nublado. Mas dizem que faz parte do encanto

(...) "

Quer isto dizer que ao prof. Marcelo Rebelo de Sousa - a conversa de cima é dele, em 14 de Agosto, na rtp1 - falta, afinal, qualquer coisa. Fica-se pelo Guincho, que é mais simples de entender.

Decifrar sombreados mais intensos e complexos é saber que não falta, por exemplo, a Cecília Meireles:

"Aqui está minha vida.
Esta areia tão clara com desenhos de andar dedicados ao vento.
Aqui está minha voz,
esta concha vazia, sombra de som
curtindo seu próprio lamento
Aqui está minha dor,
este coral quebrado,
sobrevivendo ao seu patético momento.
Aqui está minha herança,
este mar solitário
que de um lado era amor e, de outro,
esquecimento."

Quem sabe destas coisas, sabe que foi de S. Martinho que a Cecília escreveu isto.


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2.4.05

ENTRE PONTAS


“A concha de São Martinho do Porto, situada entre a praia da Nazaré e a lagoa de Óbidos, tem uma boca de 250 metros de largura. De um dos lados dessa abertura fica a ponta de Salir ou ponta de Santa Ana. Do outro a ponta de Santo António que está ligada, a norte, à ponta do Facho.

Sobre o monte do Facho acende-se uma luz.
Era ali que antigamente os pescadores acendiam fogueiras para assinalar a proximidade do porto.

A concha tem cerca de 1200 metros de diâmetro em baixa-mar, não excedendo a barra mais de quatro metros de fundura. Mas a um quarto de légua para fora encontram-se logo fundos de quarenta metros.

O assoreamento tem sido um problema da baía ao longo dos tempos.
Em 1815 o coronel Gomes de Carvalho apresentou um projecto de restauração do porto de São Martinho orçado em 32 mil réis.
As obras iniciadas um ano depois permitiram a atracagem de sessenta navios. Muitas obras foram a seguir levadas a cabo na baía, registando-se os projectos dos engenheiros Tibério Blanc e Mourão.

Conhecido ficou também o projecto de Bento Fortunato de Almeida de Eça, de Fevereiro de 1888, que tinha por fim desviar os rios Tornada e Alfeizerão para fora da concha por meio de um túnel através do monte de Salir, a terminar na costa numa extensão de 890 metros. Era uma obra que iria orçar em 88 mil réis.

Como se vê as preocupações não são de hoje nem os projectos actuais uma novidade por aí além..."

( De “Os Portos marítimos de Portugal, de Adolpho Loureiro, 1904)

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14.3.05

A CARAVELA

Vindo da rua do cinema ("Sonoro") passo o café do Frederico e a porta do "Delírio" antes de, mirando o café Carvalho, abordar o principado do Careca.

Mas não paro, sigo a curva do parque infantil e num ai eis-me no largo do turismo já com a rota desviada sobre a direita para na linha da casa dos rocha entrar no cais como deve ser:
puxado a bombordo, a sentir o rumor da baía sob o lajedo.

Galga-se o enfiamento do "cais de copos" e, passada a "colónia", já a barra desvenda o recorte do forte de São Romeu ao peregrino que, sabendo ao que vai, estuga o passo rumo ao regalo.

Ei-lo, o regalo!

Tem um nome que traz no bojo viagens e delícias: Caravela.

Depois, já abancado no convés, com a casa da alfândega - a minha ruína encantada - em mira, chega pela mão do lendário Álvaro, coração de gibão e gorra, a primeira imperial...

A seguir, em forma de pescado,a bem-aventurança.

Para me entregar mais do que era razão.


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